segunda-feira, 30 de março de 2009

medite
edite aqui na minha mão
medite
uma estrofe basta um rumo basta o sumo basta
a caneca está na minha mão
medite
mesmo com dor e sinusite
medite
Edite, meu pulso corre para sua mão
edite
meu sono
meu cabelo
meu corpo
e todas as minhas secreções
correm para sua mão.

ele...gosto muito dele: escher


ALGUNS SEM TÍTULO, SOBRE A PALAVRA

1.
Experiência fonética?
Não faço.
Separar consoantes,
encontrar vogais,
pensar sistematicamente,
Não faço.
não é despeito
É impossibilidade
São as impossibilidades
de sistematização
de racionalização
de coerência
de metáforas
Uma falta de tempo
o tempo já foi
A modernidade
segue em linha reta
faz séculos
Falarei eu de ruídos urbanos?
Nasci com eles.
Da rapidez vertiginosa
das informações?
Nasci com elas.
Sou eu, portanto, menor?
Devo ser.

XXXX
2.

Obriguei-me a desconcertante
função da escrita
exercício da palavra
e acredito agora,
da caligrafia
um ato contínuo
prescreve a fala
aborrece o outro
estima-se uma conversa
no final da linha.

Não há.

Não há dissonâncias
as coisas estão em seus lugares
firmes feito prédios
de vigas, de cimento, de gesso
argamassa, tijolos, pedras, tintas
e depois móveis
e depois gentes.
Obrigo-me a desconcertante
função
de ser acolhida
pelo espaço
Um pequeno espaço:
o canto do quarto
De lá eu declamo
mudas palavras
cansadas fábulas.
Aglutinei, mastiguei
cuspi...
e dormi, dormi
naquele canto mesmo
do meu quarto mesmo.

XXXX

3.

a ordem
nunca está pronta
os lábios
nunca comprimidos
descascam
a partícula
afasta-se
-se
-se
apazigua o meu sujeito
agora
de lábios cerrados.

XXXX

4.
Esta divisão que está na música
não a vi
nem a ouvi
esta notação
determinando duração e altura
não a vi
nem a ouvi.
Ato contínuo.
é a minha dissolução desta
queda

vida.

O silêncio tão necessário
apenas um hiato
desconectado da palavra
e a palavra, e a palavra
a repetição desnecessária
a invenção perniciosa
das letras
esta junção misteriosa
por vezes efêmera
fosse eu analfabeta
fosse eu pessoa surda

nada mudaria a fúria
mais uma outra forma da fala.

XXXXX

5.

Quantos somos
Quantas letras e sílabas
articulamos
quantas construções sintáticas somos?
Devemos contar os desvios
os neologismos
a repetição
as repetições
à procura da letra
epa! Perdi os cálculos
quantos somos?
Uns excluídos
casos retos
outros pronomes promovendo designações
Eis:
pela matemática
resolvo uma questão da gramática?
dramática?
Não,
apenas penso
quantas palavras agrupamos
quantas nomeações esquecemos

é total a afasia

Apoplexia
um número infinito
contido na gota
umas declinações infinitas
contidas na boca.

UMA

ocultei
uma ideia sem fonte
pensamento sem explicação
há um verme,
disso eu sei,
encravado no céu da minha boca,
creio até que podem ser vários
uma família.
Mas que seja um:
um verme ou
uma bactéria.
Não sei muito bem a diferença entre eles...
Deixe-me ver
Bactéria: organismo unicelular, procariótico que geralmente se reproduz por cissiparidade, pode ser patogênico para o homem e outros animais.
Verme: nome comum a todos os animais invertebrados, à execução dos insetos...pessoa infame, desprezível...
Sendo assim escolho a bactéria.

Há uma bactéria incrustada no céu da minha boca
eu sei que ela existe
como persistência de um incômodo
ela rói.
Infiltra-se na minha gengiva
acorda-me à noite
para dizer que não desistiu
Pela manhã tento cuspi-la
mas não
A minha gengiva está retraída
e a bactéria lá
resistente a qualquer assepsia bucal
É assim que me lembro:
não sou etérea
meu corpo me chama todos os dias.
É uma relação reflexiva
Ainda não sou uma personagem kafkaniana
Somos monstros distintos: a bactéria e eu
São trincheiras mínimas
Entre o corpo e o corpo.
O corpo
é só meu
Minha boca que parece deslocada de mim
Entendo,
a bactéria quer ser um deslocamento.
Contudo cansou-se
E devido a isso,
é dor cotidiana
em pouco tempo será também
Instabilidade remediada.